Eu moro na rua.

terça-feira, junho 23, 2015

Era sexta-feira e eu acordei com uma preguiça enorme, porém super alegre numa manhã chuvosa aqui em Recife. Tomei café, fiquei papeando no whatsapp e no início da tarde comecei a me arrumar para ir ao centro da cidade resolver algumas coisas e finalizar a minha tatuagem. O centro da cidade, para mim, é sempre surpreendente mesmo com as mesmas ruas, pontes, prédios e o Rio Capibaribe, eu sempre vejo algo novo e lindo nesta cidade e dessa vez não foi tão diferente. Fui até a Conte da Boa Vista, resolvi o que tinha de resolver, não finalizei a tatuagem porque eu queria voltar antes das 18hrs para casa e fui andando do Shopping Boa Vista até a Estação Central do Recife para apreciar a paisagem. Ao passar pela Ponte Buarque Coelho e entrando na Rua do Sol eu me deparei com uma cena assustadora e agressiva e confesso que tomei um baita susto ao ver aquilo. A parada estava muito cheia e a calçada bastante movimentada de pessoas indo e vindo e, no meio delas, havia um senhor jogado de barriga pra cima, com a boca aberta, sujo e parecia estar em um sono bastante profundo causado possivelmente pelo álcool. Quando eu vi aquele homem ali, deitado no chão, parecendo um lixo que havia sido jogado pela janela de algum ônibus, sendo quase pisado pelas pessoas bem no meio da calçada, imediatamente meus olhos enxeram de lágrimas e eu comecei a diminuir os passos para tentar pensar em algo que eu poderia fazer. Olhei para ele, observei as pessoas passando por ali e vi que nenhuma delas estavam dando a mínima a aquele ser humano ali jogado. Fixei o olhar nele e uma lagrima caminhou sobre meu rosto, passei por ele e por todos sem nada dizer e nem fazer. Algo gritava na minha mente dizendo: VOLTE LÁ, ACORDE AQUELE SENHOR, TIRE ELE DA CALÇADA E SIGA EM FRENTE PARA CASA COM A MENTE TRANQUILA, porém eu fui covarde e tomada pela vergonha, eu não fiz nada, me igualei aos que estavam ali que, assim como eu, fingiram não ver aquele senhor jogado no meio dos nossos passos. Isso não é nenhuma novidade aqui em Recife, ir ao centro da cidade e se deparar com moradores de rua não agride a sociedade, muito menos um bêbado deitado no meio da calçada no fim da tarde, afinal todos estão cansados demais e preocupados demais com a própria vida e não tem tempo para notar esta calamidade. O que todos não sabem, ou fingem não saber, é que todos nós moramos na rua, a rua é o nosso lar, a nossa casa e todos que habitam nela são nossos parentes. Passamos mais tempo no trabalho, escola, faculdade, curso, bancos, shows, shopping, cinema, entre outros lugares, do que no lugar que chamamos de casa e até, por muitas vezes, passamos noites fora "de casa". Engraçado isso, não é? Nós, mesmo estando mais tempo na rua, não presamos pela boa imagem dela, afinal, quem se importa com os visitantes se só nós caminhamos nela? Caminhamos em meio dos lixos que nós mesmos jogamos, não damos a mínima a aqueles que, assim como nós, moram na rua e o único problema deles é que eles não têm nenhum quarto para dormir e descansar para enfrentar mais um dia no "meio" da rua. Lamentável e doloroso a nossa visão mesquinha de que só o nosso bem-estar importa e o resto é resto. Me senti completamente inútil quando eu passei por aquela calçada e não fiz nada, nem se quer levantar aquele senhor dali para não correr o risco de ser pisado ou chutado por outro morador de rua. Eu fui egoísta e mesquinha, voltei para o meu quarto no qual eu nomeio de "minha casa" e fiquei no meu conforto pensando: será que alguém, por pior que seja, merece ser um morador permanente de rua?

Fotos: Pedro Menezes (@foto_pm) e Deyvison Marques (@marquesd).



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